sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Sobre educação e Violência


Hoje, ao ler o desabafo de Vera Lucia Teixeira Fernandes, professora que leciona no ensino fundamental em Crateús – CE, no qual falava sobre sua desilusão em relação ao magistério, alem de sua desesperança em relação ao tratamento que o Estado Brasileiro vem dando ao tema neste Pais, fui levado a refletir sobre um problema que transcende o simples âmbito da educação, pois repercute, significativamente (e ela fala disso), na crescente violência que eclode, sobretudo dentro da camada da população que, numericamente, representa a maior parcela da população brasileira.

Analisando a educação no pais e o Estado de penúria em que se encontra o magistério (profissão das mais nobres e que sempre foi tão pouco valorizada), estamos mesmo num momento muito especial onde algo precisa ser reconstruído. Não foi apenas a educação tradicional que piorou e sim, houve demandas qualitativas em todos os sentidos baseadas numa nova realidade: um planeta globalizado. E se o Governo não der uma resposta satisfatória a isso, seremos um pais de segunda categoria por muitas décadas e, obviamente ninguém deseja isso. Ate porque o mercado de trabalho requer cada vez mais, pessoas mais e melhor qualificadas e em processo permanente de educação. Não tem saída, o Brasil vai ter que resolver isso ... e logo!

O magistério sempre foi mal remunerado, pouco valorizado e conseqüentemente pouco qualificado. Não e possível que os professores possam reinvestir em suas carreiras (como sempre será preciso) se não tem recursos pra fazer isso e o Estado também não faz os investimentos necessários. Mais uma vez, se o Estado não assumir o seu papel, quem perde será sempre o Brasil e os brasileiros, não importa de que classe social sejam.

Já a questão da violência, citada em grande parte do artigo da professora Vera, esse sim e um problema bem mais complicado de resolver. Essa questão sempre me faz lembrar o artigo que o Helio Pellegrino escreveu há décadas atrás onde ele falava do “pacto social”, derivado da teoria de Freud no seu “pacto civilizatório”. Ou seja, a sociedade estabelece os parâmetros da legalidade (leis) onde crime e punição estão basicamente bem delimitados. Para que isso seja aceito pelas pessoas elas têm uma espécie de compensação em cumprir a lei: “eu cumpro a lei e sou socialmente aceito e estou inserido no tecido social, gozando dos benefícios de assim estar” ...o contrario será a pessoa ser “marginal”, ou seja, ficar a margem da sociedade, perdendo com isso, “as benesses” de ser socialmente integrado e ter “seus direitos” garantidos pelas leis constituídas como direito a propriedade; educação; trabalho; saúde; etc. etc...

O que Helio Pelegrino colocou como uma espécie de guerra civil estava baseado no seguinte conceito: “o que eu ganho para cumprir as leis”, lembrando sempre que nossa natureza Animal nos diz que a lei da “selva” representa “tomar para mim o que meus instintos dizem ser meu”. Num ambiente social de tremendas desigualdades onde os que têm mais apresenta uma distancia abissal de quem tem menos ou nada tem, que espécie de compensação esta sendo dada aos já “marginalizados” cidadãos deste pais. Logo, todo esse processo de desigualdades que passa obviamente pela educação precária, mas também por inúmeras outras desigualdades, transgridem frontalmente o “pacto social” pelo qual cumprir as leis trás benefícios concretos para determinadas camadas da população, que assim, sente que nada tem a perder ficando na ilegalidade. Nesse processo, a própria “vida” o bem mais precioso de todos, fica banalizada.

Sem querer ser simplista, deixando de fora aspectos genéticos, vivenciais e educacionais, alem da flagrante desigualdade social a que são submetidas determinadas camadas de nossa sociedade brasileira, temos que admitir que as previsões do Helio Pelegrino, antes de serem proféticas, estavam profundamente calcadas num processo, em curso, que não sendo tratado como deveria pelo Estado Brasileiro, nos trouxe a esse estado de coisas: um processo de violência endêmico e de difícil solução.

Como o ônus desse tipo de política publica não convém a ninguém, nem aos Governos e nem a sociedade, torna-se iminente que possamos buscar as soluções necessárias para senão resolver num curto prazo, visto que uma solução caminha por um processo que certamente levara algumas décadas, pelo menos estancar essa sangria que nos deixa perplexos ao ver o noticiário de nosso dia a dia onde a violência, se apresenta cada vez mais e de forma progressiva, mais presente ao nosso redor... um risco real e imediato.

Mas, como também estamos na era da informação e dos processos de integração, democratização e distribuição de informação em rede, temos cada vez mais, individualmente, importância na busca de soluções que passam por: tomar consciência; elaborar possibilidades racionais; difundir informações e conclamar outras pessoas, em rede, o que certamente representa acender uma luz, e isso me parece bem melhor do que apenas “amaldiçoar a escuridão”.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Os Construtores de Imagens.


Como dizia nosso poeta maior: “nada e’ agora…tudo e’ mais tarde. O agora e’ fotografar para revelar no futuro...” e ai, com todos os detalhes que, não captamos naquele momento em que fotografamos. Não por acaso, em nosso processo de “envelhecimento” físico, vamos perdendo a memória de curto prazo e fortalecendo, avivando, a de longo prazo...isso não pode ser algo casual.

Nesse momento de maturidade, buscamos em nosso “arquivo” os registros de incontáveis imagens que se tornam ainda mais vivas e repletas de nuances, o que certamente as reforçam; as retocam ...as revivem e nos fazem viver (re-viver).

Se “tudo e’ mais tarde”, a questão fundamental deve ser: você, como construtor de imagens, das imagens que vai revelar “no futuro”, o que de fato esta capturando e armazenando no seu “revelador”...

Claro que eu não pensava nisso quando tinha 20 anos, mas agora que já entrei na casa dos 50, assim como o Poeta quando escreveu sobre a “arte de fotografar”... Hoje, mais do que revelar as incontáveis imagens do meu passado e torná-las parte viva do meu presente sob a forma de memórias, sinto-me mais e mais responsável pelas imagens que estou construindo neste momento...e que ainda espero revelar.

A vida se torna urgente e tranqüila (paradoxo) com o passar dos anos... bem mais do que quanto a “temos” em abundancia, na juventude. Assim, cada momento vivido passa a ter uma importância visceral de construção... das imagens que imprimimos em nossa memória e as quais esperamos revelar, re-viver ou simplesmente re-vivenciar com todas as nuances da construção imperceptível e inconsciente da nossa obra.

Fico imaginando o turbilhão de imagens que são produzidas incessantemente por alguém como Oscar Niemeyer que, ao longo dos seus mais de 100 anos, qualifico como um dos grandes construtores de imagens do nosso tempo. Imagino a fulgurante beleza do seu “mural”, o qual revive intensamente num fluxo continuo de revelação.

Da mesma forma, fico imaginando quantas e quantas pessoas, ao longo de uma vida inteira, apresentam um mural pobre e desolador. Quão triste a maturidade de pessoas que não souberam (ou não aprenderam) construir imagens para as revelar de forma a re-viver...e assim, como Pablo Neruda, poder “confessar que viveram...”.

“Fotografar” representa, acima de tudo, o sentido de nossa caminhada, um legado transmitido a nos mesmos, e o mais importante: em vida. O que certamente considero mais importante do que as imagens que imprimo ou projeto nos outros (o que não quero dizer que também não seja importante).

Como construtores de imagens, somos os únicos responsáveis em imprimir a nossas vidas o brilho e a cor de que ela pode ser feita, assim como também depende da gente torná-la cinzenta e opaca (penso em muita gente que conheci ao longo de minha caminhada, que nunca se deram conta da armadilha que representava o foco no poder sobre tudo e sobre todos...imaginem que tipo de imagens construíram essas pessoas)...

O que eu quero lhes dizer neste momento e’ bem simples: assim como John Lennon nos conclamava a sermos “guerrilheiros mentais” eu os conclamo a serem construtores de imagens positivas. Assim, quando estas se revelarem, lhes será possível desfrutar o gozo da indescritível beleza da VIDA... que não e’ feita agora e sim, mais tarde...

domingo, 5 de abril de 2009

OS HABITANTES DE GAIA


Nos últimos 25 anos tenho estado cada vez mais preocupado com o que comumente chamamos de qualidade de vida no Planeta Terra. Evidente que isso não passa de mera redundância hoje, pois não imagino nenhum ser humano pensante e que tenha acesso às informações que não o esteja.

Ma o que me tira o sono algumas vezes, esta relacionado a questões que não nos fazemos no dia a dia. Claro que com o passar dos anos nos damos conta de que somos finitos e, não por acaso, a relação entre funerais e batizados, muda dramaticamente à medida que vamos atingindo a maturidade.

Claro que não quero fazer deste texto um “choratorio” ou lamentar a finititude da humanidade e da vida que, a cada dia, vemos passar mais veloz... e creiam, não se trata mais de uma questão de tempo e sim de velocidade mesmo, pois tudo parece estar ocorrendo bem mais rápido do que num passado não muito distante. Sem duvida, estamos vivendo nossas vidas de uma forma pouco romântica, meio sem poesia... na correria!

Lembro-me da letra da musica do Belchior (com Toquinho), chamada “pequeno perfil de um cidadão comum”, onde dizia:

“Era um cidadão comum
Como esses que se vê na rua.
Falava de negócios, ria,
Via show de mulher nua.
Vivia o dia e não o sol,
A noite e não a lua.”

...e fico incomodado com o fato de que estou contemplando menos por-de-sois; observando menos montanhas; curtindo menos flores e tudo aquilo que me faz amar, curtir e respeitar a natureza. Talvez seja disso que a maioria das pessoas ande acometida nesses loucos tempos e, por isso mesmo, estejamos destruindo tão rapidamente todas as espécies e o próprio ecossistema. Não deve ser possível valorizar ao que atribuímos, cada vez menos valor...

Mas estava pensando ca, com “os meus botões” quantas pessoas já teriam habitado Gaia, nossa casa, desde que nos entendemos por “gente”, ou seja, desde que surgiu em seu “colo” o que chamamos de “homo sapiens”. A pergunta que eu me fiz foi: quantos seres humanos como a gente teriam passado por nossa mãe Terra nos últimos 15.000 anos?

Instintivamente fui pro “meu amigo” Google e... surpresa! La estava um artigo do Fernando Reinach, meu ex-colega na .comDominio, projeto de DataCenter que compartilhamos no inicio dessa década. Um dia conto essa historia de como um grupo de “cientistas” da USP, com a participação do Fernando (também conhecido como um dos Pais do Projeto Genoma no Brasil), se juntou a um grupo de economistas (dos quais o Pérsio Arida, este o “Chairman” da Cia.) pra descolar alguns Milhões de Dólares com Banqueiros; Natura Capital; Votorantim Capital e outros, para construir um Data Center num momento em que se questionava a evolução da Internet no Brasil e no Mundo...

Mas voltando ao ponto central...

Reencontrei o Fernando escrevendo uma elucubração sobre minha especifica angustia e falando justamente sobre a quantidade acumulada de “viventes” nesse nosso sofrido Planeta... foi algo revelador!

Os números e as conclusões deixo pra vocês no texto que transcrevo a seguir, mas vale ressaltar algumas constatações que aprendi e sobre as quais realizei minhas inferências pessoais pra dizer que ESTAMOS VIVENDO MUITO MAIS TEMPO, se considerarmos que a 8.000 A.C. o homem vivia de 10 a 15 anos e que hoje a expectativa de vida subiu para praticamente 80 anos, mas QUE ESTAMOS VIVENDO MAL. Alem do fato de que os nascimentos por mil vem diminuindo dramaticamente ao longo dos séculos, o que nos leva a crer que estamos caminhando para uma realidade inexorável: estamos construindo um “mundo de idosos”.

Ora, se vamos ter cada vez mais idosos... com que qualidade e em que ambiente, estamos envelhecendo? Como os sete bilhões de almas que se estima, seremos em 2012, se nenhuma “Profecia Maia” nos exterminar, desfrutara de um ecossistema cada vez mais doentio e insalubre, lembrando que saúde não significa, necessariamente, a ausência de doenças e sim a qualidade com que vivemos?

Bem, leiam, tirem suas conclusões e quem sabe vamos criando essa “corrente” que pode nos ajudar a transformar “quantitativo” em “qualitativo”, ou seja, que a equação maturidade X qualidade ambiental X qualidade de vida possa ser modificada radicalmente.

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"Quantas almas existiriam nesse lugar se todos os mortos estivessem lá?"

Fernando Reinach é biólogo (fernando@reinach.com). Artigo publicado em "O Estado de SP":

Na serra de Caraguatatuba senti pela primeira vez o peso de ser Homo sapiens. Quando subíamos, meu pai parava em Paraibuna para comemorar que o DKW não havia fervido e alimentar os filhos. Foi com uma calabresa na mão que vi a frase no portão do cemitério: "Nós que aqui estamos por vós esperamos." Com 8 anos deixei o mundo animal, onde não
há consciência da morte, e me tornei humano, eternamente esperando morrer. Anteontem, ao passar por Paraibuna, lembrei de ficar impressionado com a imagem dos mortos esperando pelos vivos. Quantas almas existiriam nesse lugar se todos os mortos estivessem lá?

É um problema que merece um "back of the envelope calculation". Fazer cálculos nas "costas de um envelope" é uma das tradições da comunidade cientifica. No afã de pôr as idéias no papel, muitas descobertas foram rabiscadas em envelopes e guardanapos. Pena que nas escolas a necessidade de "resolver o problema" não deixa espaço para fazer
contas para satisfazer a curiosidade.

Parei para uma calabresa no Fazendão. Em guardanapos, tentei calcular quantas pessoas habitaram o planeta nos últimos 15 mil anos. Estimei a população da Terra a cada mil anos, lembrando que na época de Cristo não éramos 100 milhões, e hoje, mais de 6 bilhões. Imaginando que existem quatro ou cinco gerações por século, concluí que viveram no
planeta entre 30 e 90 bilhões de humanos.

A felicidade de saber que 10% das almas que passaram por aqui estão vivas durou o tempo de acessar o Google. Em 2002, Carl Haub fez de maneira quase científica a mesma conta.

Sobrou o prazer de descobrir que minha conta no guardanapo não estava tão errada. Haub chegou a 106 bilhões. Em 2002, postulou que 6% das almas viviam. Hoje faz mais sentido colocar na maternidade de Paraibuna a placa "Nós que aqui estamos (os vivos) por vós esperamos (crianças ainda por nascer)". Talvez isso nos leve a calcular quantos
humanos passarão pelo planeta antes da extinção do Homo sapiens.

Mais informações: How Many People Have Ever Lived on Earth?
(O Estado de SP, 15/1)